Desde quando sou Rafaela, preciso de um algo pra dizer.
Deve-se ter algo a dizer, sendo Rafaela, se tristeza ou alegria são percebidas.
Se Rafa sofre, Rafa escreve sobre a situação oposta, porque é o seu óbvio. Se Rafa nota alguma
felicidade, a menina destrói qualquer rastro de rima fraca que um sorriso
proporciona, e escreve sobre profundos sentimentos de calamidade. Coisas
dela.
Quando Rafa não sente, Rafa não tem como escrever. Simples
dessa forma porque Rafa vê um pouco além de si; talvez muito. Deve ser por isso
que ela sabe o que quer e o que não quer como decisão. Inclusive deve ser por
isso também que pode viver como quiser e o que quiser.
Contudo, de onde surgirá o que ela não viveu, se não há o
que viver?
A boa poesia de Rafa vem do que ela espera não viver. Ou viver.
Contanto que esteja esperando.
Eu me pego sempre achando que a menina Rafa tem certas
preferências por histórias que não são dela. Por isso a espera.
Se tem algo em que a boba Rafa é boa, é em si mesma. A
melhor Rafaela só poderia dar-se a si mesma e reimaginar-se com fins próprios,
em ciclos anuais. Ela vai e volta pra si, e a espera entre uma ida e outra
vinda só lhe causa expectativas.
Eu, no que de mim dependesse, teria uma matriz de inspiração
pra (às vezes) boba da Rafa. Poderiam ser os sentimentos que ela não teve, por
escolher não sentir; coisas minhas que, nela, fazem cócegas! Daria à Rafa
motivos suficientes para se sentir magoada ou amante. Mas...mas, mas.
Mas
deixei comigo tudo que é delírio, tudo que é bobo, que se gasta. Dou à Rafa
somente a alegria de viver o que lhe cabe e o que lhe devo, o que ela escolhe
que eu lhe dê. De mim, ela toma só o que não lhe pertence.